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Um poema pode comunicar antes de ser entendido.
                                                                                      (T. S. Eliot)

O trabalho em sala de aula é feito de «matérias que temos de dar» mas é também de outras experiências.

As experiências com a poesia podem ser diversas: ouvir, ler, declamar, escrever, dançar… Uma miríade de formas.

Ouvir poesia não é mesmo que ler poesia; ouvir poesia com os olhos abertos não é o mesmo que ouvir poesia de olhos fechados; ler poesia em voz alta não é o mesmo que declamar poesia.

Uma das experiências que decidi fazer este ano letivo é a da leitura diária de um poema, pela manhã, mal entramos na sala. Chamamos-lhe POEMA-PEQUENO-ALMOÇO.

Os alunos sentam-se, colocam as mochilas nas costas da cadeira, enquanto eu aguardo, de pé, de livro na mão, que se acomodem. E então leio. Tento que seja num registo entre o ler e o declamar. Também estou a experienciar.

No primeiro dia, para lhes explicar a ideia, fi-lo com a própria ideia: comecei a ler/declamar o poema, ainda alguns estavam a acomodar-se na cadeira. Vi bocas que se abriram e olhos que se arregalaram na direção do poema que se soltava das minhas cordas vocais, e silêncio; apenas uma ou dois  «Ah, é poesia!», «Ai, está a rimar!». Foi delicioso!

Agora já são os alunos que lembram «E o POEMA-PEQUENO-ALMOÇO?», se alguma situação extraordinária faz quebrar essa rotina.

Gosto de lhes dar a conhecer diferentes tipos de poesia: catalogada como sendo para a infância, de autores da atualidade e de tempos idos; catalogada como sendo para adultos, menos óbvia como a de Adília Lopes (falecida há pouco tempo) ou a de Herberto Helder; da tradição oral, dos nosso cancioneiro ou mais contemporânea; prosa poética, poemas com e sem rima, mais divertida ou mais séria, de diversos tipos… e, claro, de vez em quando, também um poema da minha autoria.

Às vezes, há um aluno que diz: «Lê outra vez!»; ou: «Não percebi nada!», ao que eu  respondo: «Não faz mal, a poesia é mesmo assim, nem sempre se percebe.»

Jean-Pierre Siméon, no livro A vitamina P, diz: «Eis o que eu aconselho: quando se lê um poema, é preciso aceitar não compreender. Se compreendermos tudo num poema é porque não tinha nenhum imponderável, nada a acrescentar, é porque não lhe faltava nada, nenhum sentido novo. Para quê dizer-nos algo que nós  já sabíamos?»

Sophia de Mello Breyner Andresen, no posfácio do Primeiro Livro de Poesia, Poemas em Língua Portuguesa para a Infância e a Adolescência, escreve que escolher poesias para as crianças não é tarefa fácil: «Nunca sabemos bem o que uma criança entende ou não entende e quais os caminhos do seu entendimento. Aliás, como os adultos, as crianças são diferentes umas das outras. As mais sensíveis às imagens, ao ritmo, às assonâncias e ressonâncias, terão do poema uma perceção mais precoce.»

Se acredito que o POEMA-PEQUENO-ALMOÇO levará todos os alunos a gostarem de poesia? Não. Mas se tocar pelo menos um, então já valeu a pena.

Enquanto eu sentir do outro lado vontade de me ouvir, vou continuar. E quando não sentir, talvez faça outra experiência. Pois o que é a vida senão um conjunto de experiências ao longo do tempo.

Comentários(4)

    • Maria Teresa Portal Guimarães de Oliveira

    • 7 meses atrás

    Pensei ver um poema. Gostei da crónica.

    • Isabel Gonçalves

    • 7 meses atrás

    Tenho aqui no blogue alguns poemas, mas hoje, neste dia da poesia, escrevi em prosa.
    Obrigada pelo feedback, Maria Teresa!

    • Maria Teresa Portal Oliveira

    • 7 meses atrás

    Despistada o blogue é Cantinho das Violetas.

    • Isabel Gonçalves

    • 7 meses atrás

    Este é «Canteiro das Violetras».

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